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Photo by Greg Rakozy on Unsplash

Três anos formado em filosofia, hoje. Esta é a data que defendi minha monografia e quando finalmente pude seguir em frente com outros planos. O que ficava para trás, no entanto não era a filosofia, mas a ilusão de que os estudos na área eram temporários, ou que nada do que me havia ocorrido até então teria qualquer importância no que eu seria doravante.

A filosofia é hoje, mais relevante do que nunca. Não só do ponto de vista pessoal mas também de uma macro visão da realidade. Não há nenhuma tese, nenhuma ideia complexa e nenhuma ideologia que não possa ser reduzida à filosofia da qual procede. Se você gosta de memes, deveria conhecer a semiótica e a filosofia de Peirce. Se você gosta de teorias da conspiração, deveria conhecer Platão. Se você se interessa na verdade é pela natureza e não quer saber de nada deste aculturamento, iria querer conversar com Montaigne. E assim vai.

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Quando pensamos em filósofos, é senso comum pensar em um cara quase mendigo, barba por fazer, roupas desleixadas, que fala sozinho e tem sempre um cachorro consigo. Essa é a clássica imagem do filósofo cínico, que não se importa com a sociedade e a humanidade em geral. Mas nós temos filósofos e estudantes de filosofia de todos os tipos, desde os românticos, que adoram citar Marques de Sade e Nietzsche e vivem bêbados lamentando um amor perdido, até os engomadinhos com terno e cabelo penteado, que passam horas na frente do quadro negro escrevendo fórmulas matemáticas para dizer que nossa linguagem é incapaz de responder ás questões fundamentais da filosofia.

A academia guarda estas peculiaridades, mas a filosofia não pode ser contida em meros estereótipos, não somente porque todo estereótipo é limitado, mas porque a filosofia em sua forma original, não pode ser estereotipada. E não, não é a definição de filosofia da canção “Mora na filosofia” do Caetano Veloso. É de difícil definição e não posso explicar sem me referir diretamente às crianças: elas são filósofas naturais. Dou um exemplo de minha própria infância.

Eu era criança e tinha um vizinho criança também, o Maxsuel. Eu chegava na casa dele pelos fundos da minha. Um dia estava eu conversando com ele, não sei por quanto tempo, mas me lembro que chegamos a um impasse sobre a contagem de coisas. As coisas sendo infinitas, a contagem poderia contemplar? Era infinita ou não? Eu defendia a posição de que todas as coisas poderiam se contadas e ele dizia que era possível chegar ao limite da contagem, que o infinito não tinha apenas essa dimensão binária. Foi estudando lógica com vinte e tantos anos que fui entender que Cantor havia provado que não havia apenas um infinito, mas vários. Maxsuel estava certo.


Notas:

Existencialismo (Jacques Colette)

Considerando que cristianismo e marxismo deveriam “salvar a busca existencialista e integrá-la, em vez de sufocá-la”, ele sugeria que isso fosse feito reunindo “as duas metades da posteridade hegeliana: Kierkegaard e Marx”. O cenário estava assim traçado. Ao evocar Hegel, Husserl e Sartre, J. Hyppolite voltou mais de uma vez a desenhá-lo. “Não é uma das coisas menos surpreendentes que a descoberta de Hegel a partir de 1930 foi contemporânea da descoberta de seus adversários, o existencialismo e o marxismo. Ao chegar tardiamente a Hegel, éramos capazes de descobrir nele, retrospectivamente, o que os comentadores anteriores não haviam podido ver.

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especulativo. Na verdade, é na língua dinamarquesa, em Kierkegaard, que o conceito de existencial aparece como determinando o pensamento da subjetividade, a qual não é mais entendida como o eram o Eu de Montaigne, o ego de Descartes, o eu penso da apercepção transcendental em Kant ou, enfim, em Hegel, como o resíduo de unilateralidade não assumido no espírito, que é ao mesmo tempo substância e sujeito.

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Em última instância, e é o que vemos em Schelling, uma vez acabado o percurso da filosofia dita negativa, a subjetividade se reconhece incapaz de chegar pela razão ao pleno domínio pensante dela mesma, por ser forçada a retomar por sua conta “os dolorosos clamores dos tempos antigos e modernos”, e isso na medida em que ela esbarra na “questão última e universal: Por que existe alguma coisa? Por que não há nada?”.

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Merleau ponty

Ampliando consideravelmente a perspectiva, ele acrescentava: essa fenomenologia “deixa-se praticar e reconhecer como maneira ou como estilo (…). Ela está a caminho há muito tempo; seus discípulos a reencontram em toda parte, em Hegel e em Kierkegaard, evidentemente, mas também em Marx, em Nietzsche, em Freud (…). Longe de ser, como se acreditou, a fórmula de uma filosofia idealista, a redução fenomenológica é a de uma filosofia existencial” (p. II, IX). Fim do dualismo do essência e da existência, do Wesen e do Dasein, redescoberta de um solo originário esquecido pela metafísica praticada como saber organizado e perfeitamente enquadrado pelas categorias do ser real, possível e necessário.

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Nos anexos de seu Curso de introdução à investigação fenomenológica (1921–1922), Heidegger reproduziu as seguintes linhas de Kierkegaard: “A filosofia, como uma pura abstração, paira na imprecisão metafísica. Em vez de explicar-se e de assim remeter os homens (os homens singulares) à ética, ao religioso, ao existencial, a filosofia deu a impressão de que os homens, para falar de um modo bem prosaico, podiam entregar-se à especulação despojando-se de sua velha pele e fazendo-se pura aparência.”

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